Na tarde de terça-feira, 21 de outubro de 2025, um simples café da equipe de um hospital virou pesadelo. Onze funcionários do Pronto-Socorro Central de Santa Cecília, em Santa Catarina, foram intoxicados após beberem uma garrafa de 2 litros de refrigerante — um gesto cotidiano, feito em meio à correria do atendimento médico. O que ninguém sabia era que a bebida havia sido envenenada. Ainda hoje, ninguém sabe exatamente qual substância estava na garrafa. Mas o que se sabe é que alguém fez questão de que aquela bebida chegasse às mãos certas. E isso muda tudo.
Um café que virou emergência
Às 14h, enquanto a equipe trocava histórias entre um gole e outro, os sintomas começaram. Vômito. Tontura. Sonolência extrema — um dos enfermeiros disse, depois: "Onde eu me encosto, eu durmo". Em menos de uma hora, todos que haviam bebido o refrigerante estavam em crise. Oito foram internados com sintomas graves; três tiveram reações leves. Um dos afetados era até mesmo um vereador da cidade, que precisou ser transferido para outro município por causa da gravidade do quadro. A equipe médica incluía médicos, enfermeiros, técnicos, farmacêuticos, recepcionistas e até funcionários de limpeza. Todos da mesma equipe. Todos expostos à mesma bebida.
Quem trouxe a garrafa? E por quê?
A garrafa foi trazida por uma mulher: a tia de um funcionário do hospital. Ele, por sua vez, havia sido afastado do trabalho em 8 de outubro, após uma denúncia de assédio sexual ser formalizada na Polícia Civil de Santa Catarina. Não era um boato. Não era um rumor. Era um processo em andamento. E então, 13 dias depois, ele aparece naquele café com a tia — e uma garrafa de refrigerante.
Na quinta-feira, 23 de outubro, a Polícia Civil de Santa Cecília prendeu os dois. A tia, por ter levado o líquido. O sobrinho, por ser o único com ligação direta ao ambiente e com motivo aparente. A polícia fez buscas em suas casas, apreendeu dispositivos eletrônicos e está analisando câmeras de segurança do hospital. Mas ainda não revelou o nome dos suspeitos. Nem o que foi encontrado na bebida.
O que a ciência descobriu — e o que ainda não sabe
Em 28 de outubro, o CIATox-SC (Centro de Informação e Assistência Toxicológica de Santa Catarina) divulgou que os exames de sangue e urina dos funcionários não revelaram drogas ilícitas, álcool ou medicamentos controlados. Isso não significa inocência. Significa apenas que a substância não era comum. Talvez um veneno industrial. Um inseticida. Um composto químico raro. Algo que não está em bancos de dados de toxicologia padrão.
A análise da própria garrafa de refrigerante está nas mãos da Polícia Científica de Santa Catarina. O laudo técnico ainda não saiu. E isso deixa a equipe médica e os familiares dos afetados em suspense. Porque se não foi droga, o que foi? E como alguém conseguiu contaminar uma bebida sem que ninguém visse?
Um hospital de 25 mil pessoas, em uma cidade esquecida
Santa Cecília tem cerca de 25 mil habitantes, segundo o IBGE de 2022. O Pronto-Socorro Central é o único hospital de emergência da região oeste de Santa Catarina. Funciona com cerca de 50 profissionais — todos sobrecarregados. Ninguém tem tempo para suspeitar de um refrigerante. Ninguém tem tempo para verificar o que vem de fora. E agora, todos têm medo. Medo de beber algo que não trouxeram. Medo de que isso volte. Medo de que o agressor ainda esteja por perto.
O que vem a seguir? Um caso que pode mudar protocolos
Se a análise da garrafa confirmar que foi envenenamento intencional, este será um dos casos mais graves de violência no ambiente de trabalho já registrados no Sul do Brasil. Não foi um acidente. Não foi negligência. Foi um ataque direto. E a pergunta que ninguém quer fazer, mas todos pensam: será que foi vingança?
A prefeitura de Santa Cecília não se manifestou. O governo estadual também não. Mas já há pressão para que o Ministério da Saúde exija protocolos de segurança para alimentos e bebidas em unidades de saúde — algo que, até hoje, não existe de forma padronizada. Afinal, ninguém imagina que alguém possa entrar com uma garrafa de refrigerante e envenenar 11 pessoas.
Um silêncio que pesa
O vereador que foi intoxicado ainda não foi visto em público. Os colegas que voltaram ao trabalho — e tiveram os sintomas de volta — não querem falar com a imprensa. A família da tia não retornou ligações. O sobrinho, afastado por assédio, não teve sua versão ouvida. E o que era um café entre colegas virou um caso de polícia, de saúde pública e de ética profissional. Uma tragédia que poderia ter sido evitada — se alguém tivesse perguntado: "De onde veio isso?"
Frequently Asked Questions
Como foi possível alguém envenenar uma bebida sem ser notado?
A garrafa foi trazida por uma pessoa externa à equipe — a tia de um funcionário — e provavelmente foi deixada em um local comum, como a geladeira da sala de descanso. Em hospitais lotados, o café da tarde é um momento informal, e ninguém costuma verificar a origem das bebidas. A falta de protocolos de controle de alimentos externos facilitou o acesso à bebida sem suspeita.
Por que o sobrinho foi afastado antes do incidente?
Ele foi afastado em 8 de outubro de 2025 após uma denúncia formal de assédio sexual ser registrada na Polícia Civil de Santa Catarina. O afastamento era provisório, em fase de investigação interna. A proximidade temporal entre o afastamento e o envenenamento levanta suspeitas de motivação de retaliação, embora ainda não tenha sido comprovada oficialmente.
O que os exames já descartaram e o que ainda está em análise?
O CIATox-SC descartou a presença de drogas ilícitas, álcool e medicamentos controlados nos exames de sangue dos pacientes. Mas a análise da própria garrafa de refrigerante — que pode conter substâncias não detectáveis em exames de urina — ainda está em andamento pela Polícia Científica de Santa Catarina. O resultado deve levar mais semanas, e pode revelar venenos industriais, produtos químicos ou até agentes neurotóxicos.
Por que o governo estadual não se manifestou?
O governo de Santa Catarina deixou a gestão da crise nas mãos da prefeitura de Santa Cecília, como é comum em casos de emergência local. Mas a ausência de declarações oficiais gerou críticas, pois o caso envolve saúde pública e segurança no trabalho. Muitos especialistas pedem que o Ministério da Saúde revise os protocolos de segurança em unidades de saúde, especialmente quanto ao controle de alimentos e bebidas trazidos por terceiros.
O que acontece agora com os funcionários afetados?
Todos os 11 funcionários receberam alta médica até 25 de outubro, mas dois tiveram recaída após retornarem ao trabalho, sendo reinternados. A maioria ainda passa por acompanhamento psicológico, já que os sintomas incluíram perda de memória e confusão mental. A prefeitura não informou se haverá compensação ou apoio psicológico de longo prazo, o que tem gerado preocupação entre os sindicatos de saúde.
Existe risco de novos casos no hospital?
Enquanto a investigação não termina, o hospital adotou medidas emergenciais: proibiu a entrada de bebidas e alimentos de fora, instalou câmeras na área de descanso e passou a fornecer todas as bebidas por meio de um sistema centralizado. Ainda assim, muitos funcionários dizem que não se sentem seguros — e isso, talvez, seja o maior risco de todos.